sexta-feira, novembro 18


Daniela Ribeiro comenta Tudo Acontece em Elisabethtown, de Cameron Crowe (o quinto homem do Led Zeppelin)

You're the feeling of hurting
More is what
I'm asking for
Little lies cross overboard
Wait for the crying
Love to aim at besides
Lever pulled
Go where you are little pond
Never be seen by your saw
We'll work it out
Now the feelings are right where you saw
Forever is right where we were
Never be clean
Lever pulled
Be where you are

(Lever Pulled – John Frusciante)

(Música que estaria no meu mapa/cd, caso eu fosse a Claire, e Drew estivesse cruzando a Califórnia, pós cena do "Fiasco".)

Não escrevo nada clínico, então ESQUEÇAM esse DETALHE. E parto do princípio que é um filme pra pessoas completamente abaladas pela "velocidade do som".

*

Pra nos situarmos, Elisabethtown está no ponto em que Singles parou. Almost Famous fez um retrocesso necessário, pra que fique bem claro de onde Cameron saiu, e o que ele tem a dizer. Mas o novo filme retorna ao presente, pra passar a limpo o que aconteceu com a geração dessa década, a nossa geração, que chegou à fase "adulta".

A película é uma sucessão de sarcasmos e verdades doídas jogadas na nossa cara. Comédia Romântica? Esse é o detalhe que eu chamaria de comercial.

É a vida por si mesma, engatando a primeira no fim do século XX, rumo ao século XXI.

Cameron exagera o tempo todo, mas a intenção não é ser caricata, ou ser caricata o suficiente pra que o telespectador observe os marcos, digamos, antropológicos da história.

Não podia começar diferente. I´M A LOSER BABY! SO, WHY DON´T YOU KILL ME? Um perdedor, descartável para o macro, devastado para o micro (trocadilhos hãn). A dificuldade absurda que é se inserir numa profissão decente, que traga um pouco de grana e reconhecimento. O quanto o indivíduo perde tempo e desgasta a sanidade tentando ser alguém na vida, competindo, competindo, competindo. E como a queda é fulminante!

Fulminante. Como se alguém da família morresse da noite pro dia. Família essa que o nosso herói colocou de lado, cometendo o erro clichê de tentar crescer fora de casa pra ganhar orgulho e respeito. Não conseguiu, e só vai conseguir quando volta ao núcleo. Clássico, mas nunca é demais reiterar isso. Seja com pipoca ou na Europa.

E do nada surge aquela pessoa que é chata pra caramba e a ânsia de se livrar dela vai se potencializando, até o momento que se percebe que ela é a única que te dá atenção.

O melhor assunto expressado no filme, na minha opinião, é a questão dos Substitutos.

"Substitute your lies for fact
I can see right through your plastic mac
I look all white, but my dad was black
My fine looking suit is really made out of sack"

(Substitute - The Who)

Porque um substituto não é uma classificação, é uma condição. É o que mais vamos ser e exigir ao longo dos dias. Desses dias em que tudo é efêmero, casual e descompromissado. Dias em que é tão difícil manter qualquer relacionamento, amoroso ou não. Os relacionamentos estão em decadência, e poucos conseguem ser promovidos da substituição. Levante a mão, quem ainda acha que esse quadro não é consequência da política economicamente aplicada desde os tempos da Revolução Industrial. Nossos ditadores destruindo vínculos e nos tornando uma sociedade mais confusa e descartável, era questão de tempo pra que o público se refletisse no privado.

De nada vale toda essa análise, porque o que eu senti mesmo nas cenas em que isso foi abordado, foi uma profunda angústia.

Seguindo em frente, Cameron nos dá a pintura da típica família de interior americana, tios e tias sem noção, conservadores, kitsch até o último fio de cabelo, e os nossos coadjuvantes prediletos, Jessie e o seu filhote.

Por mais antagônicos que possam parecer, Jessie (Paul Schneider) e Drew (Orlando Bloom) acabam se solidarizando pelo fracasso. Mais um soco nos republicanos de merda, mostrando que tanto faz vestir um terno ou usar cabelão, os tombos e frustrações são semelhantes. O sentimento é o mesmo quando se perde a perspectiva. A diferença é que os músicos, ou artistas em geral, são bestas e não deixam de acreditar. Acho que a idéia do diretor era fazer Jessie ensinar como ser "besta" pro Drew. A retribuição veio em seguida, com ajuda da substituta.

Hollie Baylor, provavelmente um dos papéis Top 5 de Susan Sarandon, transcende. Não há o que falar sobre ela, além de ser mais um personagem que ilustra a realidade contemporânea. Hollie é a Redenção, a catarse do filme, qualquer relação com o nome dado a ela não deve ser mera coincidência.

Confesso que a cada cena da Claire (Kirsten Dunst), eu me surpreendia, e surpreendia, e surpreendia. Não culpo os barbados por saírem do cinema desejando uma Claire. Exagerando, ou não, digo que é a personagem mais bem idealizada de qualquer história que eu conheço. Ela é chata, é autônoma, é fantástica, é imprevisível, é viajandona e viajada e é roqueira, tudo no mesmo lugar. Benzadeus. O Mapa!

A porção road movie do filme foi bem "the way I like it". O fato da música não rolar como tema panorâmico e sim como participante da história é um deleite. Acho que isso eu só vi lá atrás, no Vanishing Point (Richard Sarafian - 1971), que deixou a marca da dupla dinâmica Kowalski e Super Soul (um no Camaro 67 fudidão, e o outro no rádio tocando só as confirmadas da black music, respectivamente) pra sempre na minha vida.

A trilha sonora do filme me deixou louca, eu NÃO CONHECIA muita coisa, mas tudo bem, porque a maioria era bem "prole" do Neil Young. E, IN PAPAI YOUNG WE TRUST. Houve também mais uma enxurrada de Elton John, pra alegria da geral, e uns Tom Petty e até Ryan Adams. Depois que Tiny Dancer virou hino, Cameron ficou esperto e botou o hino do filme mais pra finaleira. Aconselho uma passada no site, pra quem gostou das músicas poder esclarecer a origem da maioria: http://www.elizabethtown.com/home.html

Concluindo, digo que o maior mérito do filme foi a apoteótica mudança de humores, de maneira drástica algumas vezes. É conseguir enxugar a lágrima e dar uma gargalhada (ou vice versa), é ficar satisfeito e acontecer uma desgraça, é se inserir na demência e ser racional em seguida.

É pra ver no cinema.

Depois compre os DVD´s de Singles, Almost Famous e este, quando lançar (alguém aí me explica porque roqueiros adoram trilogias?). E guarde bem pra mostrar pro seus filhos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Depois do filme eu ia escrever sobre porque Elizabethtown não merece glórias. Não achei metade disso que você achou. Depois tiro uma hora pra aprontar um comentário decente. Beijo.