domingo, maio 21

Egiptonando por aí

Isso não é um post normal. Mas de repente alguém se interessa.

Nesses dois últimos dias eu estive absorvida pela XII Jornada de Estudos sobre Oriente Antigo, que acontece todo ano na PUC-RS. Um grande acontecimento do ponto de vista dos estudantes de História do Brasil todo. Mais precisamente daqueles apaixonados pela história das grandes civilizações antigas do Oriente.

Apesar de ter uma boa dúzia, o foco é sempre o Egito, e as coexistentes aparecem como coadjuvantes nessa maratona de palestras. Por quê? Bem, a PUC-RS tem um núcleo de Egiptologia dotado de professores glamourosos. E, será que alguém ainda tem dúvida de que esta região é a razão pela qual a maioria dos loucos que optam pelo curso se inscrevem no vestibular?

Enfim, sexta e sábado especialistas Sudeste e Sul divagaram sobre diversos aspectos sobre o “Egito no 3º Milênio” (isso significa, de 3000 a.C. em diante), fase, sem dúvida, mais próspera desse Estado soberanérrimo. Pra ficar claro, foi quando passou por lá aqueles indivíduos de nomes ilustres: Tutankhamen, Akhenaton, Imhotep (sim, a múmia), etc..

Óbvio que nem tudo é divertido, mas a gente faz piada e se diverte do mesmo jeito. Historiadores não entendem piada, mas fazem várias, e dão risada independente do resultado.

Tudo começou com um papo bem longo sobre Obeliscos, tudo corria bem pelo crescente fértil, a apropriação das grandes obras pelos europeus filhos da puta, etc... Até que a palestrante resolveu encontrar os obeliscos do Brasil. Quando ela definiu que um pau de um metro e meio era um obelisco, eu decidi que ela precisava conversar sério com Freud, e tirei a primeira soneca.

Aliás, o evento foi todo documentado, e vai sair até em DVD, já estamos fazendo as apostam pra ver quem aparece no bom do cochilo mais vezes. Sejamos realistas, ninguém agüenta um evento de 20 e poucas horas num estado pleno de concentração.

Depois uma das professoras que eu mais aguardava, que me deu aula nos idos de 1999, não pôde ir porque teve uma cerimônia de “arremesso de cinzas em algum lugar sagrado” de um parente dela. Beleza. Meu professor atual (não mais porque eu já aproveitei a disciplina cursada no passado) assumiu, um gênio da escola positivista, tão gênio que me fez assumir a necessidade de se ter um mínimo de racionalismo e compromisso com a memória factual. Isso significa que ele é muito ninja, MESMO.

O cara, Mr. Arnoldo Dobberstein, parece um Oswaldo Montenegro mais velho, misturado com a imagem que conhecemos de Tiradentes. Acredita no “decoreba”, manda a gente fazer tabelas de ginásio e colar na parede, mas fala de umas 20, entre 33 dinastias egípcias com maestria (eu não descrevo nem uma inteira, cada dura uns 200, 300 anos), e na palestra associou o território com os outros povos asiáticos, citando muito Ciro Cardoso (o bam bam da egiptologia brasileira, que não foi no encontro, putão), e repetindo coisas que já falou na aula. Dormi de novo.

Eis que entra o poderoso, nosso Júlio César, imperador da PUC-RS, Sir Harry Bellomo (Ave Bellomo!). Um dos professores mais antigos do curso (estileira Nosferatu mixed with Sean Connery), e um dos últimos UNIVERSALISTAS do sistema acadêmico. Nesse mundo onde todo mundo se especializa em algo e é um completo ignorante no resto, tive a oportunidade de conhecer um daqueles velhinhos simpáticos que falam de QUALQUER assunto histórico com a propriedade de um pensador grego. Melhor que isso, a especialidade dele é putaria, se algum povo fez suruba algum dia, ele sabe.

Bellomo discorreu sobre o que Heródoto (primeiro historiador que lançou volumes sobre registros compilados) falava do Egito. Obviamente ele se ateve no fato de que as mulheres egípcias adoravam adornos, porque roupa mesmo era só um detalhe, uma túnica de seda transparente, algo clean. E eu nem preciso falar aqui sobre o que acontecia nos cultos a Ísis, a maioria já leu o Código daVinci e a minha introdução das preferências do nosso mestre.

O resto da tarde toda do primeiro dia de encontro foi algo surreal. Oficina de Hieróglifos. Pastei muito, mas já escrevo meu nome e posso dar uma de Indiana Jones em alguns papiros de banca de jornal. O povo já anda conjugando alguns palavrões também. A grande descoberta é que a transliteração http é egípcia...mais precisamente da linhagem de Imohtep (n mn http – literal). Realize! A internet realmente é do mal.

***

No segundo dia eu vacilei e perdi a primeira meia hora da palestra que eu mais esperava, éve. Sobre música no Egito antigo.

O professor era da Federal de Pelotas (hummmm isso mesmo), era mucho loco (pense numa mona com cabelo de Cid Guerreiro), e mostrou diversos slides de instrumentos egípcios. Gozei.

Em seguida mostrou uma montagem de desenhos afins tendo de fundo um grupo que resolveu tentar reproduzir a música dos faraós. Loucura, passei mal. Quero montar uma banda pra tocar auhis (tipo uma queña, aquelas flautas peruanas sem biqueira) e timpans (panderinho arcaico).

Então se manifesta o ilustre mais respeitado do dia, “o magrão da USP”. Correu lá pro final e falou do reinado “Saíta”, da 26ª dinastia (a que vai dar seqüência à Cleópatra, já na invasão grega-alexandrina e talz). Ficou tentando justificar que o Baixo Império não significava a decadência da terra dos faraós através de artes extremamente sincretistas com a cultura helenística.

Em vão, porque esse papo de bicho grilo de que toda arte é linda não cola comigo, e nessa fase é visível que o povo já está extremamente aculturado pelas recentes invasões dos hicsus. E os desenhistas são toscos demais. Porém, a oratória do rapagão doutorado na puta que pariu destruiu qualquer outro que podia pegar no microfone. Quero ir pra USP aprender a falar em público.

Seguiu-se o casal famoso da UNICAMP, mais conhecido como “Os Funari”, que tiveram que sair mais cedo porque os filhos estavam sozinhos.

Raquel Funari apresentou um trabalho óóótemo sobre cinema e Egito Antigo na sala de aula, mostrou trechos da Múmia (êêêÊ) e do Príncipe do Egito (desenho foda, a história de Moisés, recomendo) e discorreu sobre como aquilo afetava as crianças de quinta série. Apesar de ser meio afônica, me empolgou muito a dar aula pro ginásio. Disse, sabiamente: “se tu não pega eles na quinta série (sobre adquirir gosto pelo estudo da história), não pega mais”. Ainda sacaneou a Cleópatra, declarando que a mulér era uma baranga e que Hollywood fez um favor pra ela quando escalou Liz Taylor pro papel.

Dr. Pedro Paulo Funari é lendário entre os historiadores, todo mundo já fez algum trabalho citando o cara. Ele parece meu professor de filosofia do primeiro colegial, baixinho, magrinho e careca, ou seja, nenhuma autoridade. Como palestrante sobre Egito Antigo, ele se saiu um ótimo antropólogo social de grupos contemporâneos. Ou seja, aquela soneca básica. Prefiro os livros.

Em seguida rolou uma mesa redonda com os cientistas presentes no dia. Sobre ensino de história, nos graus fundamental e médio. Foi bem válido. Mais vontade de dar aula. Exceto a professora da FAPA, que dá aula num dos cursos mais bem falados de Porto Alegre, e veio com uma proposta INSANA de unir a metodologia da história com a sociologia. O pior nem foi isso, foi o fato de que ela levou sua socióloga parceira pra mesa de discussão, e esta última era IGUAL a “Adrian” antes de casar com o Rocky no primeiro filme da série....IGUAL...porra, não agüentei e ri o tempo todo, aqueles óculos de gatinho de armação mega grossa, cabelinho chanel com presilha presa do lado, tímida igual irmão mais novo na casa do primo de quinto grau, hilário.

Pra complicar mais ainda, elas LERAM toda a explanação. Passei um tempo esperando o Stallone entrar no teatro, como não rolou (e depois de falar pra todo o meu “grupinho” da semelhança incrível e gerar um uníssono de gargalhadas e gente gritando ADRIAN com a boca torta), resolvi ir tomar um Moccacino na máquina automática da lanchonete do prédio 40, prédio este mais conhecido como “O Shopping”.

E daí acontece o Momento Ímpar. Como todos sabem, em simpósios sempre rolam o Momento Ímpar, aquela hora onde alguém completamente off-topic faz um discurso se achando completamente inserido no grupo, pro delírio da torcida. Após a rodada de debates, temos um espaço pra perguntas da platéia. Sempre tem aquele cara que levanta a mão e ao invés de perguntar alguma coisa, narra momentos dramáticos e emocionantes de sua vida pessoal. No caso, um senhor, que estufa o peito pra dizer que guerreou no Egito contra o Oriente Médio em 1959 e já havia contado seus feitos umas 3 vezes antes do Momento Ímpar. Era de se prever que o Momento seria dele.

Quando todos deveriam se portar quietos para o início do Ato de Encerramento. O conviva levantou mais uma vez, solicitou o microfone e disse (tentarei reproduzir as pérolas que lembrar):

- Meus jovens, vocês na situação de estudantes de história, não podem deixar de viver isso. Não queiram ir pra Europa ou pros Estados Unidos. Queiram ir pro Egito – e abre um sorriso extasiado – visitar as pirâmides, Quéops, Quéfren, as tumbas de poço, El Amarna, o vale dos reis, tudo que puderem – tom melancólico e saudoso – aproveitem o que esta nação nos deixou. E no sábado – risadinha de novo – eu sei que vocês gostam de cinema, de um barzinho...mas saibam que se tiverem a oportunidade de ir num restaurante, o façam! Um dos meus momentos mais inesquecíveis foi quando aquela menina subiu na minha mesa fazendo a dança do ventre! Memorável! O Egito é um lugar único!

A esposa o cutucava para que se sentasse logo e voltasse ao ostracismo. Não teve resultado. O homem recebeu uma longa salva de palmas. O Momento Ímpar, que ele nunca esquecerá, ao ter se erguido em meio àquele monte de estudantes sedentos por ciência e disse que sua epifania foi ao presenciar o sacolejo de uma dançarina do ventre.

Ímpar.

Retomando os trabalhos, chegamos então ao Ato de Encerramento. Prof. José Baldissera, da Unisinos foi divino, na sua qualidade de padre. Os professores da UNISINOS me fazem acreditar no amor ao Espírito Santo, sendo ótimos pesquisadores e cientistas, que já varreram o Rio Grande do Sul com as descobertas arqueológicas mais contundentes da região, e por acaso são jesuítas. O foda é que mulher dificilmente consegue sair pra escavações com eles. Por isso eu estudo na PUC. Rá.

Ele simplesmente leu uma poesia em louvor à Akhenaton e Nefertite, com imagens de mesmo assunto na tela (o teatro do 40 possui uma tela de cinema, a se dizer..), e de novo músicas reconstruídas do Egito Antigo. Daí a piada foi eu, porque comecei a chorar.

Nefertite foi uma das grandes estadistas do Egito, ao lado do faraó, governou com uma classe quase Jackie O’nesca. Vale lembrar também que TODOS os palestrantes falaram de Hatsepsut, a mulher que governou o Egito por anos com punho forte e decisão, após a morte de seu marido e inclusive se vestia com a roupa do faraó pra que obtivesse mais respeito e dignificasse sua posição. Uns dizem que ela foi a primeira transexual da história.

Que venha à tona, cada vez mais, as várias outras mulheres que zelaram pela “terra fértil”, durante os áureos anos glorificados pelo Rei Sol.

***

Por fim, o mais importante, peguei meu primeiro certificado de 20 hs pra entregar na reitoria cursos de extensão. (Só uma piada de historiador)

Por Daniela Ribeiro

3 comentários:

Anônimo disse...

ei, o professor de pelotas não se chamava fábio vergara?
meu amigão!

Dani Hyde disse...

huahauhauahau

sim, é esse mesmo!

Anônimo disse...

obviamente, eu não li.